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Domingos Amaral
Costuma dizer-se que os Estados Unidos da América são um país muito mais liberal do que a Europa.
Pode ser verdade em muitas áreas da economia, mas no desporto não é.
Os mercados de trabalho das grandes ligas desportivas americanas (NFL, NBA, MLB, NHL, MLS) são muito regulamentados e os jogadores não mudam de clube com facilidade.
Praticamente não existe "mercado de transferências", há muito poucas no basquetebol ou no futebol americano.
Mudar de clube é muito difícil, e os contratos são blindados, protegendo mais os clubes do que os jogadores.
Além disso, existem "tectos salariais" para evitar o crescimento estratoesférico dos salários.
A NFL, a liga mais bem gerida do mundo e a que mais lucro dá, limita muito a mobilidade dos jogadores, e tem um sistema de contratos complexo, distinguindo os jogadores conforme o número de anos que já jogaram.
Todas estas regras visam impedir a explosão dos custos salariais nos clubes, e talvez por isso os clubes desportivos americanos, em quase todas as ligas, são muito mais rentáteis e luvrativos do que os clubes de futebol.
Há limites aos custos mais rigorosos e isso impede o endividamento permanente.
Contudo, não é assim no mundo do futebol.
A liberdade quase total de movimentos é a norma da FIFA.
A mobilidade dos jogadores é enorme, bem como o seu poder, e o dos seus empresários.
Também existem muitos empresários na América, mas as regras são diferentes.
A roda viva planetária em que se transformou o mercado dos jogadores de futebol raia a loucura, e os principais prejudicados são os clubes.
Os salários dos jogadores estão quase sempre a subir, e no topo da qualidade atingem valores absolutamente espantosos.
Eto´o é o mais pago, a 20 milhões de euros por ano, o que é um absurdo, pois nem sequer é dos melhores do mundo.
Esta espiral de subida dos custos é a principal responsável pelo endividamento colossal da maior parte dos clubes de futebol.
Seja em Inglaterra, em Espanha, Itália ou Portugal, os clubes endividaram-se para poderem competir, mas quem tem ganho mais são jogadores e empresários.
A facilidade legal com que os jogadores mudam de clube, a lei das transferências, as janelas do mercado, tudo conspira contra os clubes.
Os contratos, mesmo quando são recentes, não garantem quase nada, e os jogadores podem "forçar a saída".
Este Verão tem sido pródigo em "casos" em Portugal.
No Benfica, além do melodrama de Cardozo, houve também o "desaparecimento" de Oblak, que tinha contrato; as opacidades da venda de Roberto; ou o estranho caso de Pizzi.
No Sporting, há o "caso Bruma" e há também o "caso Labyad", e ainda outros menores.
Nem o FC Porto está imune a estas coisas.
Atsu foi relegado para a equipa B, alegadamente por ter ameaçado assinar pelo Benfica.
Rolando, depois de um ano numa obscuridade forçada, saiu finalmente, dizendo cobras e lagartos dos dirigentes azuis.
E há ainda Jackson Martinez, que fez apenas uma época, reconheça-se que de muita qualidade, e agora já ameaça em declarações públicas o clube, estabelecendo as suas condições:"ou renovo ou saio".
O enquadramento legal demasiado solto e permissivo, e demasidado favorável aos jogadores, aliado ao funcionamento quase selvagem do mundo do dinheiro, criam tremendos problemas às equipas, e sobretudo aos treinadores.
Com quem podem contar Paulo Fonseca, Jorge Jesus ou Leonardo Jardim?
Até aos primeiros dias de Setembro, os clubes estão vulneráveis, o planeamento é difícil de estabilizar, e a cabeça dos jogadores continua desfocada.
Eles pensam em dinheiro, em melhorar a vida, e isso é compreensível.
Mas, os prejudicados com esta rotação imparável de jogadores são sobretudo os clubes.
É também por isso que o endividamento é tão elevado.
Gerir um clube nestas condições de mercado é muito complicado. Na América é mais fácil, porque a América não é tão liberal no desporto.